quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Textão como um subgênero da auto-ajuda

TEXTÃO COMO UM SUBGÊNERO DA AUTO-AJUDA

Jaqueline Gomes de Jesus


Os últimos anos têm sido difíceis demais para todos nós. Estamos cansados, feridos, muitos caíram no caminho... Confesse: tem sido uma luta diária dormir e acordar, não é mesmo? Aí você acessa a internet para se depara: com a habilidade de uso das palavras e de interpretação de texto e mundo das pessoas cada vez mais debilitada e dependente do juízo dos outros; com a heroicização da mediocridade; com a ignorância sistemática de comunidades sobre as próprias raízes. Como se desativa o whatsapp por um tempo?

Os olhos ardem. A cabeça dói. As pernas formigam; os prazos se tornaram cada vez mais curtos, os computadores entram em obsolescência programada, a indústria cultural nos divertia e agora instrúi, o plágio se tornou tão vulgar que estão copiando até episódios pessoais que você relata nas suas redes sociais, mudança climática e miséria avançam, "siga estas fórmulas para produção de conteúdo". A lógica produtivista é um dos sintomas psicossociais do capitalismo, que nos transforma em mercadorias e literalmente nos consome. Nessas horas as pessoas sensatas pensam: "Ainda bem que não tenho uma arma em casa".

Daí eu me lembro que poderia ter sido assassinada na infância, mas sobrevivi e frutifiquei: se eu fizesse ou não fizesse algo, dissesse ou não dissesse algo, era tudo apontado como ruim, risível ou desinteressante pelos outros. Fui algumas vezes abandonada ou preterida. Machucou, sim, mas o que fiz? Continuei fazendo e dizendo. Entrou por um ouvido, aproveitei o que valia a pena, mandei "se fuder" quando precisavam para evoluírem e muitas vezes deixei sair pelo outro ouvido, quando concluí que o silêncio é fundamental quando constatamos que boa parte das pessoas não lhe ouvem realmente.

Cá estou, viva, apesar de tudo. Tenho experiência de 43 anos em escalar pedras e plantar flores mundo afora, parafraseando aqui Cora Coralina. Então, minha dica bem didática e direta é mandar um foda-se e fazer, pois você sofrerá críticas de qualquer maneira, principalmente quando você não está no padrão de humano idealizado pela sociedade excludente que vivemos.

Você é uma pessoa maravilhosa, faça o que for possível, sem negar a sua própria paz, o próprio ócio, a própria raiva (que a sua ira não lhe afogue em ódio), os próprios amores (que sua paixão não lhe aliene). Isso não significa que tudo que você cria é excelente, infalível, mas que pode melhorar. Ainda estamos vivos para resistirmos, e oxalá nos insurgirmos.

Jaqueline Gomes de Jesus

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