segunda-feira, 5 de maio de 2014

O que as recentes mobilizações sociais falam para a Psicologia?


O QUE AS RECENTES MOBILIZAÇÕES SOCIAIS FALAM PARA A PSICOLOGIA?

Quando lhe/me faço essa pergunta estou, fundamentalmente, trazendo à baila uma brevíssima reflexão sobre trabalho e instrumentalidade da Psicologia.

Psicologia, entenda, está aqui colocada como um conjunto de saberes e fazeres com vistas a alguma intervenção social - visa a empiria, e não apenas como uma ontologia sobre os seres humanos que se satisfaz em se restringir ao campo teórico.

A nossa formação acadêmica reverbera os tipos de intervenções que, vislumbram-se, possamos vir a ter em nossas atuações profissionais, quaisquer que sejam - ela é uma previsão sobre os possíveis rebatimentos sociais da atuação dos indivíduos.

Somos, considerando apenas o pequeno universo brasileiro, milhões de cidadãs e cidadãos, a maioria excluídos do acesso a bens sociais e econômicos, quando não estão submetidos a processos institucionais de efetiva exclusão. Eis a questão social que se apresenta.

O que interessa nesse momento, sem qualquer interesse normativo ou futurológico, é buscar entender o discurso comum das coletividades, as suas representações sociais do político, os mecanismos e estratégicas de mobilização e de estímulo à participação aí colocados, os aspectos psicossociais da mobilização.

Desde as Jornadas de Junho de 2013, observamos a profusão de manifestações apartidárias, sem lideranças fixas, senão anômicas. Por um lado, isso demonstra a crescente autonomia coletiva face aos processos políticos tradicionais, dos quais os brasileiros se sentem distantes, quando não enojados.

Por outro lado, quando não se levantam bandeiras - ou pior, quando bandeiras e representações partidárias têm sua participação repudiada, senão impedida - nessas manifestações, também me indago se não estamos diante de uma mobilização social de cunho reacionário, porque, ao se pretender apartidária, ingenuamente ou sub-repticiamente se torna despolitizada, ao exigir mudanças aos agentes políticos sem participar das mudanças com eles.

O que a demanda coletivizada por uma democracia mais direta, senão individualizada, nos fala? O que a militarização da relação do Estado com esses movimentos sociais nos fala? O que a criminalização das mobilizações sociais nos discursos dos meios de comunicação nos fala?

A Psicologia, e mais propriamente a Psicologia Social, precisa olhar os movimentos sociais e os de massa com criticidade - evitando apontar as ações coletivas no cotidiano, genericamente, como inerentemente revolucionárias, positivas, boas, campos livres da necessidade de reflexão.

Uma apreciação não-minimalista exige, em primeiro lugar, a compreensão de que essas mobilizações são expressões localizadas de questões sociais maximizadas, as quais se apresentam:
Em um contexto cultural de desenvolvimento social e econômico desigual, porque empreendido em uma sociedade profundamente oligárquica e horizontalmente coletivista, como é a brasileira;

Em um contexto político baseado na lógica assistencialista e de repressão a "discursos perigosos", como o da laicidade, da liberdade de pensamento, da igualdade étnico-racial, da equidade de gênero, da expressão despatologizada da identidade de gênero, da livre vivência da orientação sexual, entre outros;

Em um contexto local-global de maximização dos recursos de comunicação em massa, principalmente por meio da internet, que potencializam a troca de informações entre grupos e subgrupos de maneira independente das mídias tradicionais.

Temos muitos dados a coletar e que urgem por análises, não só em função de termos curiosidade em pesquisar, mas principalmente porque a sociedade merece vários olhares acerca de sua realidade (lembrando que existem demandas e interesses sociais antagônicos) - abundam os de cunho político e sociológico, e o que podemos oferecer é o olhar psicossocial, que em geral é diferente da imagem social sobre a nossa profissão. Nesse campo de forças, a Psicologia se faz necessária.

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