Henfil!
"A noção de que todo o poder emana do povo não mais é entendida como uma conquista abstrata, porque restrita a princípios universalistas, mas como uma justificativa para a busca por novas formas de participação, para além do voto em representantes. É por meio dos novos movimentos sociais que as pessoas viabilizam, cada vez mais, uma democracia direta pautada pelo conceito de integração social.
O conflito é uma característica inerente, que ao invés de fragilizar a resolutividade das estratégias coletivas, reitera o caráter injusto/desigual do status quo, a partir do aumento da visibilidade das reivindicações desse e daquele grupo social ante à sociedade como um todo, condição essencial, de acordo com Silva e Camurça (2010), para que os problemas desses grupos deixem de ser vistos como particulares e passem a ser considerados uma injustiça.
(...) O posicionamento que reconhece a complexidade das ações coletivas no âmbito da sociedade civil organizada defende a potencialidade de eventos localizados, que à primeira vista podem parecer superficiais, de subsidiar transformações psicossociais e políticas:
os movimentos sociais são muito mais que a soma de suas lutas. Eles são um processo contínuo de ações coletivas com algumas características que lhes são próprias. São ações de longa duração, feitas para revisitar ou transformar uma situação econômica, cultural ou política, e envolvem uma grande quantidade de pessoas que passam a atuar juntas durante muito tempo e de forma organizada, ou seja, realizam ações deliberadas e planejadas (Silva, 2010, p. 7).Desse modo, é fundamental, para aumentar a resolutividade dos movimentos sociais de cunho político-identitário, entre eles os de gênero, orientação sexual e raça/etnia destacados no presente texto, para além de tentar afetar a consciência desta ou daquela pessoa, questionar a consciência política da sociedade, contradizer a realidade social vigente, problematizar os estatutos e o cotidiano jurídico, para que o comprometimento com os outros, mais do que apenas fruto de empatias pessoais, resulte da convergência coletiva para o fim ou o apaziguamento de conflitos.
A formação de pessoas e, portanto, de grupos sociais, que reflitam sobre a sua realidade, criem uma nova moralidade e busquem transformar o Estado é crucial para se poder, a médio e a longo prazos, modificar o Estado que exclui essas pessoas, por meio da demonstração intelectual à sociedade — e da participação política, não necessariamente partidária — que o Estado criticado não une as pessoas e classes.
Essa ação coletiva é um dos estágios, o mais avançado, das relações intergrupais, e se define pelo aumento da consciência do grupo em desvantagem acerca da injustiça de sua condição, percepção essa que leva os oprimidos membros desse grupo a reavaliarem a forma como se reconhecem e são reconhecidos, a buscarem identificar as particularidades que os tornam únicos e a inovar em suas estratégias de competição com o outro grupo (Taylor & Moghaddam, 1994).
O compromisso que os diferentes agentes governamentais podem assumir no combate à discriminação e à violência decorrente da identidade social das pessoas, por meio de ações de cunho afirmativo, não ocorre desassociado da mobilização de grupos sociais, que se organizam como minorias ativas, para influenciar o Estado.
(...) A análise desenvolvida ao longo deste texto é realista, pauta-se no fato de que, quando se remete em mudanças sociais, o termo “a longo prazo” pode se referir a décadas, ou séculos.
Como defendia Del Prette (1990), o nível de análise da Psicologia sobre os movimentos sociais pode contribuir empiricamente na busca por explicações para esse fenômeno e as questões que ele coloca quanto a comportamento coletivo, afiliação, crença, identidade social e tantos outros fenômenos psicossociais" (Jesus, 2012, p. 179-181).
Jesus, J. G. (2012). Psicologia social e movimentos sociais: uma revisão contextualizada. Psicologia e Saber Social, 1(2), 163-186. Disponível em http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/psi-sabersocial/article/view/4897/3620.
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