terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Movimentos Sociais e Polêmicas


"As mobilizações da sociedade civil organizada, como as marchas, paradas, ocupações, podem ser definidas como ritos, ao romperem temporariamente com a rotina e realizarem performances de identidades e papéis sociais não-hegemônicos (Jesus, 2010).

Os ritos sociais são uma forma de comunicação simbólica, contém mensagens metafóricas que 'informam sobre os sistemas cosmológicos daqueles que os realizam (...). Servem como indícios sobre os pensamentos e sentimentos dos atores' (Galinkin, 2001, p. 28).

A performance ritual dá distintividade a seus realizadores, tornando público quem são eles. As identidades são explicitadas de forma ritualizada, e a repetição do ritual tem, ainda, um papel pedagógico, transmitindo as ideias, crenças e representações do grupo que o realiza para os iniciantes e para os grupos externos.

Como exemplo, tanto o carnaval quanto a marcha política, para Peirano (2003), constituem-se como rituais, na acepção de que, no ritual carnavalesco, prevalece 'a sugestão de que o momento extraordinário pode se transformar em rotina' (p. 44), enquanto na marcha política, a natureza ritualística está em seu caráter sacrificial, remontando, como evento único e especial, às procissões, mas partindo dessa estrutura para dispor de seu caráter questionador.

Reitera-se a importância desse caráter de ritualização das mobilizações porque ele permite aos seus participantes vivenciar qualitativamente o que acontece, em uma perspectiva não-linear, como aponta Gouveia (2011), de 'momento certo ou oportuno. (...) tempo em sua forma de possibilidade' (p. 97).

Essa potencialidade permite aos movimentos sociais propor, até mesmo, a discussão de temas polêmicos ou mesmo envolvendo atos ilegais, como o uso de drogas ilícitas, cuja liberalização é proposta pela Marcha da Maconha, realizada em todo o mundo, com base em um calendário de ações locais. O coletivo organizador das ações da marcha no Brasil aponta como seus objetivos:
Criar espaços onde indivíduos e instituições interessadas em debater a questão possam se articular e dialogar; Estimular reformas nas Leis e Políticas Públicas sobre a maconha e seus diversos usos; Ajudar a criar contextos sociais, políticos e culturais onde todos os cidadãos brasileiros possam se manifestar de forma livre e democrática a respeito das políticas e leis sobre drogas; Exigir formas de elaboração e aplicação dessas políticas e leis que sejam mais transparente, justas, eficazes e pragmáticas, respeitando a cidadania e os Direitos Humanos (Coletivo Marcha da Maconha, 2012).
Reitera o coletivo que 'não têm a intenção de fazer apologia à maconha ou ao seu uso, nem incentivar qualquer tipo de atividade criminosa' (Coletivo Marcha da Maconha, 2012). Nesse aspecto, o Supremo Tribunal Federal – STF garantiu no ano de 2011, em decisão unânime, a realização da referida marcha no Brasil, ao entender que o debate quanto à descriminalização não é equivalente ao ato de incitação ou apologia ao ilícito.

No entendimento do ministro Celso de Mello, decano da corte, 'o debate sobre abolição penal de determinadas condutas puníveis pode ser realizado de forma racional, com respeito entre interlocutores, ainda que a ideia, para a maioria, possa ser eventualmente considerada estranha, extravagante, inaceitável ou perigosa' (Notícias STF, 2011)" (Jesus, 2012, p. 167-168).

Jesus, J. G. (2012). Psicologia social e movimentos sociais: uma revisão contextualizada. Psicologia e Saber Social, 1(2), 163-186. Disponível em http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/psi-sabersocial/article/view/4897/3620

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